sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Crise Mundial 3

Até agora falou-se principalmente das motivações internas da crise americana, o "imbroglio" das "subprimes" e como isso levou ao chão o setor financeiro e, em seguida, o setor real da economia.

Mas, os antecedentes da estória ainda não foram bem dissecados pela mídia. Recentemente eu li um livro (talvez excessivamente otimista) do Stiglitz de como a globalização pode dar certo, e um ponto que ele enfatiza é como o sistema de reservas internacionais deve ser reformulado.

A grande questão é: ao longo da última década, os países emergentes (em especial os asiáticos) acumularam reservas em moeda e títulos estrangeiros (particularmente dólares). Qual a conseqüência disso? Aumentaram a demanda por títulos "sem risco" dos EUA e grandes países desenvolvidos, levando à queda de juros nestes países. Os juros baixos no primeiríssimo mundo, por sua vez, produziram a farra financeira que se viu (subprimes inclusas), e também aumentaram o déficit em conta corrente dos EUA de maneira assombrosa. Os EUA se tornaram o tomador de empréstimos de última instância do mundo inteiro, e este dinheiro foi usado para financiar o seu excesso de consumo e a aventura no Iraque.

E que outras consequências isso teve? Os países ditos emergentes estão com o caixa cheio de títulos em dólares (e euros, e yens), até o nosso querido Brasilll tem US$ 200 bilhões em reservas, rendendo 0% ao ano, ou quase.

O que Stiglitz argumenta é que este dinheiro aplicado em moeda "forte" poderia render mais se aplicado em moeda local, em projetos dentro dos próprios emergentes.

Mas, a atitude dos emergentes é mais que compreensível - gato escaldado tem medo de água fria, e as reservas "cavalares" servem pelo menos como proteção psicológica contra ataques especulativos às moedas locais, embora com o tamanho dos mercados financeiros hoje em dia eu acredite que a proteção seja mais psicológica que real - se o mercado cismar com uma moeda, será difícil que ela resista (exceto no caso da China).

No caso dos asiáticos, a situação é ainda mais surreal - estes países têm poupança interna de verdade, não precisam importar capitais (ao contrário do nosso querido país tupiniquim, que oferece a maior taxa de juros do mundo a quem se dispuser a aceitar o "enorme" risco do Real). E ainda assim os asiáticos colocam seu dinheirinho no primeiro mundo.

A China é hoje o maior detentor de títulos de dívida do governo dos EUA, tem US$ 1 trilhão em títulos, mas segundo o NYTimes de hoje, o apetite chinês por dólares está acabando. O BC Chinês, que na prática dita as regras de funcionamento dos bancos naquele país, já avisou que a idéia é passar a investir em projetos locais.

E isso me leva a um outro livro, bem recente, que comecei a ler - Martin Wolf, Fixing Global Finance. Já no prefácio ele alerta sobre a situação que falei aqui, os EUA como o grande tomador de empréstimos do mundo, ou o "enxugador" da liquidez dos emergentes.

E a grande questão que surge é: que tipo de crise acontecerá quando a disposição dos outros países em adquirir títulos americanos diminuir, como se vê hoje com o comportamento da China?

Alguns poderiam dizer - azar, quem mandou os EUA se endividarem de tal maneira! Mas, a questão não é tão simples assim. Superávits e déficits em conta corrente são um jogo de soma zero. Se o déficit em CC dos EUA é enorme, existe uma coleção de países com superávits em CC cuja soma (pasmem!) é igualzinha ao déficit em CC dos EUA.

Logo, se os EUA forem "pro saco", todo mundo vai também, em maior ou menor escala, não é apenas uma "marolinha".

O que o Martin Wolf observa é, a crise do déficit já vinha se delineando há bastante tempo, e ninguém se deu ao trabalho de olhar. A questão que se coloca agora é: como sair dela da maneira menos dolorosa possível, e para esta pergunta de trilhões de dólares ninguém parece ter encontrado a resposta.




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